ASSEMBLEIA GERAL DE ACIONISTAS DIGITAL

A Lei nº 6.404/76 (Lei das S/A) dispõe acerca da realização de assembleia geral de acionistas pela sociedade anônima, que tem poderes para decidir todos os negócios relativos ao objeto da companhia e tomar as resoluções que julgar convenientes à sua defesa e desenvolvimento. Classificam-se em ordinária e extraordinária, dependendo das matéria que integram a ordem do dia.

Assim, o artigo 132 da Lei das S/A prevê a realização de uma assembleia geral ordinária (AGO), que deve acontecer nos 4 (quatro) primeiros meses seguintes ao término do exercício social. Com isso, as companhias que encerram o seu exercício social em 31 de dezembro devem realizar a AGO até o dia 30 de abril para deliberar sobre (i) as contas dos administradores e demonstrações financeiras; (ii) a destinação do lucro líquido do exercício e a distribuição de dividendos; e iii) eleição dos administradores e dos membros do conselho fiscal, quando for o caso. Qualquer outra assembleia que se faça necessária será extraordinária (AGE).

Em decorrência do Covid-19 e das medidas de distanciamento social adotadas, foi editada a MP 931/2020, convertida na Lei nº 14.030/2020, que possui algumas regras excepcionais de aplicação restrita ao período de pandemia, e outras regras não transitórias, que alteraram o Código Civil e a Lei das S/A, por exemplo.

Um exemplo de medida transitória foi a que prorrogou o prazo de realização da AGO para 7 (sete) meses no ano de 2020. Por outro lado, a possibilidade de participação e voto à distância em assembleias gerais realizadas de forma digital não são transitórias e foram regulamentadas pelo DREI, em sua IN nº 81, e também pela Instrução CVM nº 622.

A realização de assembleia digital merece destaque, uma vez que possui como desafio garantir aos acionistas as condições de participação análogas às presenciais, bem como garantir documentação adequada que comprove que os direitos dos acionistas foram observados. A esse desafio se soma a segurança digital e de identidade, uma vez que deve ser garantido que os participantes e votantes sejam realmente aqueles de direito, e que os sistemas utilizados sejam eficazes contra ameaças de manipulação de dados, votações ou gravações. Ainda, o sistema utilizado pela companhia deve assegurar o direito de presença, atuação e acompanhamento por todos os participantes.

Dessa forma, é responsabilidade da companhia garantir (i) a segurança, a confiabilidade e a transparência do conclave; (ii) o registro de presença dos acionistas; (iii) a preservação do direito de participação a distância do acionista durante todo o conclave; (iv) o exercício do direito de voto a distância por parte do acionista, bem como o seu respectivo registro; (v) a possibilidade de visualização de documentos apresentados durante o conclave; (vi)  a possibilidade de a mesa receber manifestações escritas dos acionistas; (vii) a gravação integral do conclave, que ficará arquivada na sede da sociedade; e (viii) a participação de administradores, pessoas autorizadas a participar do conclave e pessoas cuja participação seja obrigatória.

Vale ressaltar que, se tiver vedação expressa no estatuto da companhia, as assembleias não podem ser realizadas de forma digital. Por isso, as assembleias digitais são uma faculdade e as novas regras não se aplicam àquelas em que a participação e votação sejam exclusivamente presenciais.

Neste sentido, o DREI em sua IN nº 81, regulamentou as assembleias de sociedades anônimas fechadas e a ICVM nº 622 regulamentou no que tange às sociedades anônimas abertas. Assim, as assembleias podem ser semipresenciais, quando os acionistas puderem participar e votar presencialmente no local físico ou à distância; ou digitais, quando os acionistas só puderem participar e votar à distância. Nestes casos, para todos os fins legais, as assembleias digitais serão consideradas como realizadas na sede da sociedade.

As regras de convocação, instalação e deliberação não foram alteradas e, por isso, as assembleias deverão obedecer às normas atinentes à sociedade anônima, bem como às disposições do estatuto social.

Além disso, os documentos e informações necessários para a realização devem ser disponibilizados previamente por meio digital seguro, e o instrumento de convocação deve informar se a assembleia será semipresencial ou digital. Ainda, deve detalhar como os acionistas podem participar e votar à distância. É facultado às companhias divulgar um anúncio de convocação resumido, com a indicação de endereço eletrônico onde as informações completas podem ser acessadas de forma segura.

É possível verificar que foi feita uma regulamentação neutra do ponto de vista tecnológico, cabendo a cada companhia criar e utilizar sistemas seguros. Assim, a sociedade precisa atender aos requisitos mínimos regulamentados, podendo ter o seu próprio sistema ou adquiri-lo no mercado dentre as opções disponíveis.

Somente é exigido que a sociedade utilize sistemas e tecnologias que sejam acessíveis a todos os acionistas e, caso cumpra esta determinação, a sociedade não pode ser responsabilizada por problemas decorrentes dos equipamentos de informática ou de conexão do acionista, assim como por quaisquer situações que não estejam sob o seu controle. O DREI esclareceu que sistema de tecnologia acessível entende-se por aquele facilmente acessado por todos com equipamentos comuns (smartphones e computadores).

A sociedade deve manter arquivados todos os documentos relativos à assembleia semipresencial ou digital e gravação integral da assembleia, pelo prazo aplicável a ação que vise anulá-la. Esta disposição visa garantir o cumprimento das garantias que foram listadas acima.

A participação e votação a distância dos acionistas podem ocorrer mediante o envio de boletim de voto a distância e pela participação a distância durante a assembleia. Neste sentido, como não foi definido modelo de boletim de voto a distância, cumprindo-se os requisitos exigidos, a forma é livre. Além disso, a sociedade deve disponibilizar o boletim de voto a distância em versão passível de impressão e preenchimento manual.

O boletim de voto a distância deve ser enviado ao acionista na data da publicação da primeira convocação e deve ser devolvido à sociedade no mínimo cinco dias antes da data da realização do conclave. Dessa forma, cabe à sociedade informar ao acionista o recebimento, bem como se os documentos são suficientes para considerá-lo como válido ou se há necessidade de retificação e reenvio.

O acionista que enviar o boletim de voto a distância antecipadamente de forma válida, exercendo seu direito de voto quanto às matérias objeto da ordem do dia, será considerado presente na assembleia, não sendo necessário o seu comparecimento na data do conclave. Entretanto, o seu envio não impede o acionista de participar da assembleia semipresencial ou digital e exercer o seu direito de voto, ocasião em que o boletim enviado será desconsiderado.

Com relação aos livros societários pertinentes e a ata da respectiva assembleia, é possível que a assinatura seja feita isoladamente pelo presidente e secretário da mesa, que certificarão todos os acionistas presentes. Essa regra possui o intuito de facilitar o procedimento, mas não impede que a sociedade faça com que todos os presentes assinem a ata de forma digital, ou até mesmo fisicamente.

Quando a ata não for elaborada em documento físico, as assinaturas deverão ser feitas com certificado digital emitido pela ICP-Brasil ou qualquer outro meio de comprovação da autoria e integridade dos documentos.

O fato de a assembleia ter sido realizada de forma semipresencial ou digital não altera a necessidade de arquivamento na respectiva Junta Comercial, ocasião em que deve constar a forma de realização da assembleia, bem como todas as formas de participação e voto a distância que foram permitidas.